Em artigo publicado na Gazeta do Povo, de Curitiba (edição da quinta-feira, 02/04), o advogado, e especialista do Instituto Millenium,
Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr. tece considerações sobre a gravidade do uso político dos fundos de pensão. A conta, afirma, tentará ser jogada no colo dos participantes, beneficiários e pensionistas
Segundo ele, em flagrante violência à norma constitucional, alguns fundos de pensão acabam por ser usados como feudos do Estado
Ao comentar a matéria nesta segunda-feira (06/04), Ruy Britto Pedrosa, presidente da AAPBB (Associação de Aposentados e Pensionistas do Banco do Brasil), afirma que a preocupação com o uso político das fundações inclui a Previ. E destaca o que chama de utilização ilegal e abusiva do patrimônio do Plano de Benefícios 1 com o fim de capitalizar o patrocinador, sem ônus para seus acionistas.
Avalia Ruy Brito que o patrimônio do Plano 1 também é empregado para privilegiar diretores do Banco, investidos na condição de “estatutários” apenas para usufruírem milionárias aposentadorias integrais, sem que para tanto contribuam ao longo de suas atividade
“Tal privilégio foi estendido aos diretores da Previ e da Cassi, sem que o órgão fiscalizador e regulador, a PREVIC, revele capacidade para impor qualquer decisão saneadora”, registra o presidente da AAPBB.
Leia abaixo a íntegra do artigo veiculado na Gazeta do Povo
O USO POLÍTICO DOS FUNDOS DE PENSÃO (Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr.*)
Conforme informações veiculadas na imprensa nacional, grandes fundos de pensão brasileiros estão apresentando vultosos resultados deficitários. Os números impressionam; os supostos prejuízos acumulados alcançam a cifra de bilhões de reais, colocando em risco a justa e devida aposentadoria complementar de milhões de trabalhadores, ativos e inativos. Os fatos, uma vez comprovados, representarão ilicitudes de diferentes graus e latitudes, impondo-se a séria promoção de processos investigatórios competentes, bem como a adoção de urgentes medidas corretivas com vistas à imediata proteção do patrimônio coletivo.
Em tempo. É oportuno destacar que a previdência privada foi criada para ser uma alternativa robusta e eficaz ao limitado e problemático sistema público previdenciário. Para bem cumprir sua missão institucional, o aparato jurídico nacional elevou o regime de previdência privada a norma de natureza constitucional, prevista no Título VIII (Da Ordem Social) da Lei Maior da República. Entre as garantias fundamentais, foi determinado que os fundos de pensão brasileiros devem ser organizados de “forma autônoma” ao regime oficial (art. 202, caput). Ou seja, a previdência privada requer autonomia real e não meramente formal, imaginária ou fictícia.
Frisa-se que o referido preceito de autonomia não é restrito à esfera jurídica, mas tem como principal finalidade garantir a independência administrativa lato sensu dos fundos de pensão, procurando assegurar a integral soberania da gestão das entidades de previdência complementar. E gestão soberana é administrar sem peias, favores ou compadrios. Aqui, no entanto, ainda estamos engatinhando. Infelizmente, a autonomia gerencial de muitos fundos de previdência complementar é absolutamente rasa e limitada.
Em flagrante violência à norma constitucional, alguns fundos de pensão acabam por ser usados como feudos do Estado, vindo a acolher dirigentes tecnicamente despreparados, cujo principal mérito é o de serem amigos do rei. Nesse contexto nebuloso, o resultado desastroso de conhecidos fundos de pensão é o triste desfecho de um processo danoso de partidarização total da máquina pública, que cava raízes em territórios proibidos, condenando ao exílio os altos valores da meritocracia, transparência, competência e exação.
O grave é que a conta do uso político dos fundos de pensão tentará ser jogada no colo dos participantes, beneficiários e pensionistas, como ocorre agora com o Postalis, dos Correios. Como sempre, após roerem o osso, os lobos partirão para novas caçadas, deixando a carcaça para inocentes aposentados. Ora, no Estado de direito, o canibalismo jurídico é prova de ilicitude. A eventual abusiva imposição de “contribuições extraordinárias” sobre os inativos. Além de ilegal, apenas revelará o absoluto desprezo com pessoas idosas que, no entardecer da vida, têm o legítimo direito de viver em paz e com tranqüilidade financeira. Antes de querer cobrar dos aposentados de boa-fé, os fundos devem punir os dirigentes responsáveis por atos de má gestão; além disso, a própria Previc poderá ser responsabilizada por eventual desídia ou frouxidão no seu dever fiscalizatório sobre os fundos de previdência complementar.
Por tudo, de duas, uma: ou o Brasil passa a respeitar as leis ou será corroído pelo pus da ilegalidade. Na loteria dos acontecimentos, onde será que nosso país vai parar?
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(*) Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr., advogado, é especialista do Instituto Millenium