O Tesouro Nacional segurou o pagamento de subsídios de financiamentos agrícolas ao Banco do Brasil para ajudar a melhorar o seu resultado fiscal. Os créditos que o banco federal têm a receber da União praticamente dobraram em um ano, chegando perto de R$ 8 bilhões em junho.
O Tesouro Nacional segurou o pagamento de subsídios de financiamentos agrícolas ao Banco do Brasil para ajudar a melhorar o seu resultado fiscal. Os créditos que o banco federal têm a receber da União praticamente dobraram em um ano, chegando perto de R$ 8 bilhões em junho.
O Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor, apurou que a dívida com o banco federal subiu basicamente porque, nos últimos dois anos, o Tesouro passou a conter o pagamento desses subsídios agrícolas para reforçar o seu caixa. É uma nova faceta da chamada "pedalada fiscal", que agora passa a incluir um banco controlado pela União, mas com o capital aberto na Bolsa e acionistas privados.
O balanço do Banco do Brasil do segundo trimestre registra um crédito de R$ 7,944 bilhões contra o Tesouro relativo a "equalização de taxas de juros da safra agrícola". O número quase dobrou em relação aos R$ 4,158 bilhões registrados um ano antes, nas demonstrações financeiras de 30 de junho de 2013.
É um procedimento semelhante ao adotado pelo Tesouro com a Caixa Econômica Federal, com a retenção do ressarcimento ao banco oficial relativo ao pagamento de programas sociais, como seguro desemprego, para melhorar o resultado fiscal. A Caixa procurou a ajuda da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF) da Advocacia Geral da União (AGU) para obrigar o Tesouro a pagar os valores devidos. O Banco do Brasil, até o momento, não recorreu à AGU.
O balanço do BB sempre registra créditos junto ao Tesouro relativos aos subsídios financiamentos agrícolas, pois a verificação das quantias devidas e seu efetivo pagamento obedece a um trâmite burocrático e muita negociação. Mas os valores atingiram um novo patamar a partir de 2013. Entre 2011 e 2012, os valores oscilaram entre R$ 3 bilhões e R$ 3,5 bilhões.
O Banco do Brasil executa diversos programas de financiamento rural com juros subsidiados. O banco empresta para os agricultores cobrando taxas menores do que paga nas suas captações, e o Tesouro está obrigado por contrato a cobrir a diferença numa operação conhecida como "equalização de taxas de juros".
Era de se esperar que, nos últimos anos, houvesse algum aumento nos créditos do Banco do Brasil junto ao Tesouro, já que a carteira de crédito agrícola do banco federal vem subindo. Mas a dívida do Tesouro com o BB cresceu numa velocidade desproporcionalmente mais alta.
O volume de financiamentos agrícolas aumentou de R$ 131,498 bilhões para R$ 164,758 bilhões entre junho de 2013 e de 2014, o que representa alta de 25%. Os recursos equalizáveis dessa carteira subiram 50% entre um período e outro, de R$ 47,638 bilhões para R$ 71,463 bilhões. Mas o volume de subsídios que o banco oficial tem a receber do Tesouro aumentou muito mais, em 91%, na mesma base de comparação, indicando um descasamento entre o que o governo cobre e as despesas que o BB tem na operação dessas linhas.
Algumas das linhas de financiamento que mais cresceram são justamente as que mais recebem subsídios do governo, como a safra do Semiárido, o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção (Inovagro) e o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA).
Mesmo feitas todas essas ponderações, fontes oficiais ouvidas pelo Valor PRO confirmam que os créditos do BB perante o Tesouro aumentaram porque os pagamentos estão sendo retidos para melhorar o resultado fiscal do governo federal. Uma fonte oficial ponderou que, mais recentemente, o Tesouro intensificou os pagamentos, mas não a ponto de mudar o quadro geral de acúmulo de dívida.
Do ponto de vista do BB, o atraso dos subsídios não causa maiores prejuízos porque os créditos a receber são corrigidos pela Selic, e o banco federal, segundo os indicadores publicados no seu balanço na semana passada, trabalha com uma boa folga na sua base de capital e de liquidez.
A maior diferença ocorre na contabilidade do governo, já que, ao atrasar os pagamentos, o Tesouro está adiando uma despesa e melhorando o resultado que divulga todos os meses.
Os créditos do BB contra o Tesouro deram seu primeiro salto no segundo semestre de 2013, chegando a R$ 6,333 bilhões. No ano passado, o governo se desdobrava para cumprir a meta de superávit primário de R$ 73 bilhões, lançando mão de receitas extraordinárias e adiando repasses de verbas a Estados e municípios. Os desafios persistem neste ano, num ambiente de queda de arrecadação e aumento dos gastos.
Procurado pelo Valor PRO, o BB disse em nota que "as relações entre o Banco do Brasil e o Tesouro são expressas em contrato de prestação de serviços que abrange inclusive os processos de equalização do crédito rural". O Tesouro informou que não se manifestaria.