Consultados pelo Valor, dois bancos de varejo afirmaram que costumam incorporar a seu resultado valores de contas irregulares, em um procedimento parecido àquele adotado pela Caixa Econômica Federal em 2012. Outra instituição apenas afirmou que adota procedimento diferente, sem dizer qual.
Consultados pelo Valor, dois bancos de varejo afirmaram que costumam incorporar a seu resultado valores de contas irregulares, em um procedimento parecido àquele adotado pela Caixa Econômica Federal em 2012. Outra instituição apenas afirmou que adota procedimento diferente, sem dizer qual.
O encerramento das contas é adotado depois de esgotadas as possibilidades de busca dos clientes, segundo executivos de ambas as instituições. Mesmo assim, o registro da conta permanece nos arquivos do banco, tornando possível que, a qualquer momento, o dono regularize sua situação, recebendo o dinheiro de volta.
Chamou a atenção dos bancos, porém, a magnitude do ajuste feito pela Caixa em 2012, de R$ 719 milhões. O montante é considerado elevado pelos dois executivos consultados pela reportagem, principalmente quando comparado aos acertos feitos em seus próprios bancos.
De acordo com um deles, a incorporação de saldos a pagar é uma situação bastante usual, por exemplo, nos títulos de capitalização cujos proprietários não são correntistas de bancos. Nesses casos, depois que o banco emprega todos os esforços para localizar o dono do título, o dinheiro se transforma em uma receita.
"Não existe lei que diga o que fazer com esse dinheiro", diz um dos executivos. Segundo ele, a entrega dos recursos ao Tesouro Nacional poderia representar um risco para a instituição financeira, já que é ela quem deve ressarcir o depositante que regularizar sua situação.
Outro fato que surpreendeu foi a falta de transparência para a receita extraordinária gerada, de R$ 719 milhões. Em geral, os bancos costumam explicar em seus balanços valores não-recorrentes expressivos como esse. No caso da Caixa, a demonstração financeira de 2012 afirma que o banco teve R$ 866,9 milhões de "outras receitas operacionais", mas sem explicitar quais. Em 2011, essa rubrica foi de R$ 280,5 milhões.
Como o montante chamava a atenção, o Valor chegou a procurar a Caixa em fevereiro do ano passado para peguntar que tipo de receita entrava nessa linha do resultado, mas a resposta do banco naquela época foi evasiva: "No subgrupo outras estão consideradas uma série de subcontas que não tiveram uma classificação específica."
Ontem o banco foi novamente questionado sobre o tema. Afinal, se havia segurança de que o procedimento adotado era correto, por que a resposta de um ano atrás não esclareceu o assunto? A Caixa repetiu o argumento de que seguiu as regulamentações do Banco Central e acrescentou que "a resposta fornecida anteriormente pela Caixa contemplou o escopo da pergunta".
É de se notar ainda que em 2012 a Caixa registrou seu maior lucro histórico, de R$ 6,06 bilhões, que foi celebrado na época por ter sido alcançado mesmo após a redução drástica das taxas de juros, em resposta aos apelos da presidente Dilma Rousseff.
Mas não foi só o lucro que atingiu níveis elevados. Os dividendos pagos ao Tesouro somaram R$ 7,49 bilhões naquele ano, nível fora do padrão histórico.
Foi também em 2012 que a Caixa apresentou seus menores índices de Basileia dos últimos anos. O indicador cheio chegou ao piso de 12,62% no terceiro trimestre de 2012 (ante o limite mínimo de 11% do Banco Central), com o capital de nível 1, de maior qualidade, em apenas 6,4%.
Em tese, a necessidade de pagar dividendos e a alavancagem elevada seriam fatores que tornariam desejável um lucro maior.
Mas a Caixa nega que tenha agido movida por esses incentivos. Segundo a instituição, os lançamentos foram feitos em 2012 (ao longo do ano) porque, embora o procedimento referente às contas irregulares tenha se iniciado em 2000, apenas no fim de 2011 "foi implementado um sistema corporativo com o objetivo de manter o registro individualizado das contas encerradas, preservando os direitos dos clientes".
Ainda segundo a Caixa, o efeito positivo no lucro de R$ 120 milhões no balanço do primeiro semestre, e de R$ 420 milhões acumulado de 2012, representavam, respectivamente, 0,27% e 0,75% do patrimônio de referência do banco, o que seria "insignificante" do ponto de vista da Basileia.
Vale lembrar, contudo, que o efeito nesse caso pode ser duplicado, já que o lucro aumenta o patrimônio líquido da instituição, que integra seu patrimônio de referência de nível 1, o que permite que a instituição aproveite um volume maior de instrumentos híbridos de capital e dívida como capital de nível 1 e 2.
Fonte: Valor econômico