Para fazer frente ao forte aumento da carteira de crédito em um cenário de margens mais apertadas, os bancos públicos ampliaram fortemente a captação de recursos com o uso de títulos com lastro em financiamentos imobiliários e ao agronegócio. Isentas de imposto, as letras de crédito conhecidas pelas siglas LCA e LCI possuem um custo de funding inferior a outros instrumentos, como as tradicionais cédulas de depósito bancário (CDB).
No fim de junho, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal registravam um total de R$ 88,4 bilhões em emissões desses títulos, um crescimento de 150% em relação ao fim do segundo trimestre de 2012, de acordo com informações dos balanços. Juntos, os bancos detêm quase a metade de todo o estoque de emissões. E como são os detentores das maiores carteiras de crédito rural e imobiliário, ainda têm espaço para expandir as captações.
A principal vantagem da emissão de letras de crédito é o custo de captação mais baixo. Embora o benefício fiscal seja destinado ao investidor, os bancos abocanham parte do ganho ao oferecerem taxas mais baixas nas emissões.
Mesmo pagando menos, os papéis oferecem aos clientes uma rentabilidade competitiva em relação aos CDBs, que estão sujeitos a uma tributação que varia de 22,5% a 15%, de acordo com o prazo da aplicação. Os títulos também estão no rol de aplicações garantidas pelo fundo garantidor de créditos (FGC) até o limite de R$ 250 mil.
Como as emissões de LCI e LCA não estão sujeitas ao recolhimento do compulsório, os bancos também ficam com mais recursos à disposição para emprestar e obter margens melhores na intermediação financeira.
Para especialistas, a redução no custo de funding com as letras ajudou as instituições a baixarem as taxas cobradas nos empréstimos sem comprometer os resultados após a "cruzada" empreendida pela presidente Dilma Rousseff pela redução dos juros bancários.
Os grandes bancos privados também registraram aumento nas emissões de letras, mas, como estão em um momento de maior conservadorismo na concessão de crédito, as captações são puxadas pelas instituições públicas.
Ao mesmo tempo, BB e Caixa têm oferecido taxas consideradas mais atraentes do que os concorrentes, principalmente para clientes de altíssima renda, do chamado segmento private, conforme apurou o Valor. Como resultado, passaram a atrair clientes da concorrência. Marcio Percival, vice-presidente da Caixa, diz, porém, que o banco tem praticado taxas em linha com as dos concorrentes. O BB não comentou o assunto.
Nos últimos 12 meses, o BB ampliou em 20% os recursos administrados de clientes private, que em junho somavam R$ 69,7 bilhões. "Eles estão inundando o mercado", diz o executivo de um banco concorrente, que pediu para não ser identificado.
As instituições não abrem o custo das captações realizadas com as letras. Mas segundo executivos concorrentes, os bancos públicos têm oferecido pelo menos 92% da taxa interbancária (CDI) a clientes de alta renda. Com a isenção fiscal, essa taxa é equivalente à de um CDB que paga entre 108% e 119% do CDI para o investidor, dependendo do prazo. Nos concorrentes privados, as taxas da LCI/LCA dificilmente chegam a 90% do CDI.
No BB, que lidera o crédito rural no país, as emissões de LCA mais que triplicaram nos últimos 12 meses até junho e alcançaram R$ 47 bilhões. Com a entrada no financiamento imobiliário, o banco começou a originar lastro para emitir LCI. No fim de junho, o saldo dos papéis era de R$ 350 milhões, mas o objetivo do banco é alcançar R$ 6 bilhões no fim do ano. O Valor apurou que, em agosto, o BB já reunia R$ 2,5 bilhões em LCI.
Além de avançar sobre a alta renda, a captação com as letras chegou à rede de varejo. O BB mapeou correntistas que tinham dinheiro parado na conta e ofereceu aplicações em LCI pagando uma remuneração equivalente à da poupança, segundo uma fonte.
A Caixa fez o caminho oposto e deu início às captações com LCA em novembro, pouco depois de o banco anunciar a entrada no segmento de crédito rural. De zero no fim de junho de 2012, o saldo das emissões de LCA saltou para R$ 1,5 bilhão em junho.
Na área imobiliária, as emissões de LCI têm como principal objetivo suprir a demanda por crédito para a compra da casa própria, que tem crescido mais que a captação da poupança, segundo o vice-presidente de finanças da Caixa, Marcio Percival. A poupança fechou junho em R$ 190 bilhões, com alta de 17% em 12 meses. Já o crédito imobiliário, incluindo as operações do Minha Casa Minha Vida, teve expansão de 34,6%, para R$ 238,5 bilhões. (Colaboraram Felipe Marques e Carolina Mandl)
Fonte: Valor Econômico