A desvalorização adicional do câmbio nas últimas semanas - em pouco mais de 20 dias, o dólar saltou de R$ 2,25 para cerca de R$ 2,40 - pode colocar em risco o compromisso do Banco Central de entregar este ano um IPCA menor do que os 5,84% observados no ano passado, principalmente diante da pressão da Petrobras por um novo reajuste da gasolina, avaliam economistas ouvidos pelo Valor. Neste cenário, afirmam, não está descartado que o BC possa prolongar o ciclo de aperto monetário na tentativa de conter o repasse da desvalorização cambial para a inflação doméstica.
A desvalorização adicional do câmbio nas últimas semanas - em pouco mais de 20 dias, o dólar saltou de R$ 2,25 para cerca de R$ 2,40 - pode colocar em risco o compromisso do Banco Central de entregar este ano um IPCA menor do que os 5,84% observados no ano passado, principalmente diante da pressão da Petrobras por um novo reajuste da gasolina, avaliam economistas ouvidos pelo Valor. Neste cenário, afirmam, não está descartado que o BC possa prolongar o ciclo de aperto monetário na tentativa de conter o repasse da desvalorização cambial para a inflação doméstica.
Os primeiros sinais de que os economistas começam a incorporar o real mais fraco em relação ao dólar nos seus cenários pode ser visto no Boletim Focus. Embora as projeções para o IPCA neste ano e em 2014 praticamente não tenham se alterado recentemente, as estimativas para o índice nos próximos 12 meses estão em alta há sete semanas. Em 28 de junho, os economistas projetavam que a inflação nos 12 meses à frente seria de 5,65%, expectativa que subiu para 5,97% no dia 16 de agosto.
Para Daniel Moreli Rocha, economista do Banco Indusval & Partners, este é um indício de que o mercado está incorporando o real mais fraco às suas contas gradativamente. Rocha afirma que os riscos para a sua projeção de IPCA de 5,85% em 2013 aumentaram nas últimas semanas, com a mudança de patamar do câmbio. Em sua avaliação, é questão de tempo até que o mercado trace novo cenário para a economia neste ano, a partir de uma taxa de câmbio mais desvalorizada. Seria, em termos, uma repetição do quadro observado em junho, quando a mudança no patamar de câmbio resultou em uma onda de revisões de estimativas no mês seguinte. "Talvez as expectativas para inflação neste ano ainda estejam um pouco tímidas, se considerada a forte alta do câmbio desde maio", diz.
Eduardo Velho, economista-chefe da INVX Global Partners, afirma que caso o dólar se estabilize no patamar de R$ 2,40 até o fim do terceiro trimestre, o IPCA encerrará 2013 com alta de 6%. Por ora, Velho estima avanço de 5,7% para o indicador oficial de inflação no ano. O economista considera que após a nova disparada da moeda americana, R$ 2,30 virou piso para a taxa de câmbio. O Banco Central, no entanto, deve intensificar o uso da política cambial, bem como de medidas macroprudenciais, para controlar pressões excessivas sobre o dólar, diz o economista.
Parte da resposta também deve vir da política monetária, na avaliação de Velho. O economista acredita que mediana de apostas do Focus para a Selic, atualmente em 9,25% ao ano ao fim de 2013, deve ser revista para cima nas próximas semanas em função do novo patamar do câmbio. "9,5% virou 'o piso do piso'", afirma.
Fabio Romão, economista da LCA Consultores, avalia que o Banco Central vai prolongar o atual ciclo de aperto monetário em resposta à desvalorização recente do câmbio, levando a taxa básica de juros para 10% até novembro, com aumentos de 0,5 ponto percentual por reunião.
Para Romão, a política monetária mais austera será suficiente para que o atual nível de câmbio, que chegou a R$ 2,40 nesta semana, não se mantenha até o fim do ano. Ainda assim, diz, a desvalorização mais acentuada do câmbio nas últimas semanas complica o cenário inflacionário para os próximos meses porque aumenta a defasagem do preço da gasolina em relação ao mercado externo e pressiona a Petrobras. Em função da escalada da moeda americana, o economista passou a contar com aumento do combustível em setembro e elevou sua projeção para o IPCA neste ano de 5,7% para 6%. Romão calcula que a Petrobras irá aumentar, já em setembro, a gasolina em 8% nas bombas.
Para Thaís Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg & Associados, o dólar mais alto é um dos principais riscos ao cenário inflacionário. No entanto, a economia pondera que para que haja um repasse do dólar a R$ 2,40 aos preços é preciso que a taxa de câmbio fique estacionada neste nível por pelo menos três meses - hipótese que não está em seu cenário. "Se os leilões de concessão em infraestrutura derem certo, o investidor estrangeiro pode voltar a se interessar pelo Brasil, revertendo as expectativas em relação ao país", comenta a economista, que estima avanço de 5,8% no IPCA neste ano.
O atual cenário econômico, na avaliação de Flávio Serrano, economista do BES Investimento, é favorável ao repasse do aumento do dólar aos preços ao consumidor. Para ele, a deterioração das expectativas, o perfil expansionista do governo, os incentivos ao consumo e a intensidade da variação cambial contribuem para um maior impacto do câmbio na inflação.
A desaceleração da economia brasileira, em sua avaliação, não será suficiente para frear o aumento de preços no varejo. "Vamos ver um reflexo direto nos produtos comercializáveis e, daqui um ano, nos preços administrados."
O reflexo do câmbio na inflação depende, entre outras variáveis, da percepção do mercado quanto à perenidade da mudança, afirma o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otavio Leal. "O dólar a R$ 2,40 chegou ao mercado financeiro, mas ainda não bateu na economia real. As empresas continuam trabalhando com um dólar ao redor de R$ 2,30", afirma Leal, que projeta avanço de 5,7% no IPCA neste e no próximo ano.
Fonte: Valor Econômico