A decisão anunciada pelo Banco Central na semana passada de antecipar o fim do mecanismo que dava liquidez a bancos de menor porte, associada à deterioração da perspectiva de crescimento da atividade econômica do país, à piora do cenário externo, ao próprio aumento da taxa Selic e às dívidas externas contraídas pelas instituições que vencem neste ano e no próximo, deve levar ao encarecimento do custo de captação dos bancos médios.
A decisão anunciada pelo Banco Central na semana passada de antecipar o fim do mecanismo que dava liquidez a bancos de menor porte, associada à deterioração da perspectiva de crescimento da atividade econômica do país, à piora do cenário externo, ao próprio aumento da taxa Selic e às dívidas externas contraídas pelas instituições que vencem neste ano e no próximo, deve levar ao encarecimento do custo de captação dos bancos médios.
O atual incentivo dado pelo BC que ajuda os bancos médios a captar prevê um sistema de punição aos bancos grandes, que têm um corte na remuneração dos depósitos compulsórios se preferirem recolher o dinheiro aos cofres da autoridade em vez de emprestá-lo aos menores. O objetivo é direcionar os recursos à compra de carteiras de crédito e títulos. Com o mecanismo, cujo término agora foi antecipado de agosto de 2014 para março de 2014, as instituições médias já receberam R$ 46 bilhões.
"Os bancos grandes podem buscar outro tipo de aplicação e as instituições médias terão de negociar taxas melhores. A medida garantia que bancos médios pagassem taxas mais baratas", afirma Manoel Felix da Cintra Neto, presidente da Associação Brasileira de Bancos Comerciais (AABC), que reúne as instituições de médio porte. Para ele, o setor enfrentará uma elevação do custo de funding.
Para se ter uma ideia, no ano passado, alguns bancos médios relataram que estavam conseguindo fechar operações com as instituições maiores ao custo do Certificado de Depósito Interbancário (CDI) - taxa que reflete a média do custo dos empréstimos entre as instituições financeiras - ou até abaixo.
Mas nem todos os recursos potenciais foram direcionados aos bancos médios. A parcela de 50% do recolhimento compulsório sobre depósitos a prazo sem remuneração, se não direcionada para os de menor porte, representaria um volume de cerca de R$ 75 bilhões, diz um boletim da Febraban (Federação Brasileira de Bancos). Mas, pelos cálculos do BC, os bancos médios receberam R$ 46 bilhões. A diferença entre esses valores foi alocada em boa parte no financiamento de veículos, possibilidade aberta pelo BC em maio de 2012, mas que não existe mais.
A antecipação do cronograma pode fazer falta a parte dos bancos médios, diz Carlos Eduardo Daltozo, analista da BB Investimentos. "Ela garante um custo de funding interessante e favorece a diversificação dos instrumentos de captação." O ponto positivo é que a decisão do BC dá pistas de que os bancos menores não enfrentam problemas de liquidez. Até porque têm emprestado bem menos.
O analista da corretora Grupo Bursátil Mexicano (GBM), Gilberto Tonello, diz que os bancos mais expostos ao fim do incentivo são aqueles com maior percentual de captações com vencimento em até dois anos ou com uma pior diversificação de funding.
A maioria dos bancos menores enfrentou uma escalada do custo de funding depois dos problemas com os bancos PanAmericano, Morada e outros. Manoel Cintra diz que a decisão do BC foi um sinal claro de que os efeitos desses problemas ficaram para trás.
Ceres Lisboa, analista responsável pelo setor de bancos da Moody's, explica que os R$ 46 bilhões foram parar principalmente nas instituições com melhor risco de crédito. Mas não há uma certeza de que o segmento perderá esses recursos. "Os bancos maiores podem até permanecer com essa alocação", diz Ceres. Para a analista, não haverá impacto significativo do fim da medida, que estima representar apenas 11% do funding desses bancos médios. "Eles não enfrentam problema de liquidez."
Independentemente da decisão do BC, Tonello ressalta que o custo de captação dos bancos médios deve subir como consequência da economia mais fraca, que resulta em menor crescimento dos bancos e faz com que o investidor exija maior retorno. Andre Riva, também analista de bancos da GBM, lembra que a decisão da agência de classificação de risco Standard & Poor's de revisar a perspectiva da nota soberana do Brasil para "negativa" levou a uma piora da percepção de risco dos bancos, o que afeta seu custo de funding, com consequências piores para as instituições menores.
Alguns bancos já têm um custo de captação acima da média do segmento, como o Pine e o BicBanco, notam analistas do HSBC em relatório de junho. No primeiro caso, há um uso considerado elevado de títulos estrangeiros, que são 10% da captação total, e de Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGE), que correspondem a 23% do funding. "A captação com DPGE em aberto, que vemos mais como uma fonte emergencial, é de R$ 1,2 bilhão", diz o relatório.
No caso do BicBanco, os analistas afirmam que a captação no exterior representa 12% do funding total, enquanto os DPGEs respondem por 36% do total de depósitos a prazo. "O BicBanco utilizou 57% de seu limite de DPGE, e esse índice só vem aumentando", diz o texto.
Outro ponto a se considerar é que, segundo estimativas da Dealogic, empresa que compila dados sobre o mercado, até o fim de 2014 haverá o vencimento de US$ 1,3 bilhão em bônus de bancos médios brasileiros. Considerando os empréstimos sindicalizados, a dívida ainda aumenta. Dentre os bancos com ações na bolsa de valores, por exemplo, o Daycoval terá de pagar US$ 165 milhões em junho de 2014, referentes a um empréstimo sindicalizado. Esse montante representa 18,8% do total de captações externas da instituição.
Já o BicBanco tem uma dívida externa de US$ 331 milhões que vence neste ano e no próximo, o que equivale a cerca de 28% das captações no exterior. Por sua vez, as dívidas externas do Pine que vencem até dezembro de 2014 somam R$ 50,99 milhões, 7,8% das captações externas do banco.
Com o vencimento dessas operações, as instituições precisarão captar. "A questão é não encontrar mercado para refinanciar essas dívidas", diz Ceres, da Moody's. Assim, esses bancos terão de se voltar ao mercado local, onde concorrem com as instituições grandes, que são vistas como menos arriscadas.
O contraponto é que a alta do custo de captação pode não pesar tanto em um primeiro momento, porque a atual perspectiva de baixa expansão da atividade econômica limita o avanço do crédito. Assim, os bancos médios podem não necessitar de muito funding, o que também não é uma notícia animadora.
Fonte: Valor econômico