ANTONIO TEMÓTEO
ANTONIO TEMÓTEO
O debate em torno da regulamentação da Lei das Domésticas se transformou em divergência entre o Executivo e o Legislativo. O descompasso ficou evidente ontem, após o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, afirmar que a pasta enviará à Casa Civil uma proposta para manter a multa de 40% do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) nos casos de demissão do trabalhador sem justa causa.
Quando questionado se o percentual referente aos domésticos deveria ser menor que o dos demais profissionais, Dias foi enfático. "Na minha opinião pessoal, não." Para acirrar mais os ânimos, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, disse que a normatização da lei deve ficar a cargo do Executivo. "Questões que têm impacto previdenciário e orçamentário precisam ser (regulamentadas) por iniciativa do governo. Mas estamos abertos para debater e ouvir sugestões", desconversou.
Ao se posicionar pela manutenção da taxa nos valores atuais (de 40%), o ministro do Trabalho deixou claro que falta sintonia entre o discurso do Palácio do Planalto e o do relator da Comissão Mista de Consolidação das Leis, senador Romero Jucá (PMDB-RR), que defende uma penalidade entre 5%, nos casos em que patrões e empregados chegarem a um acordo, e 10%, naqueles em que a rescisão de contrato for feita unilateralmente pelo empregador, sem justificativa.
Procurado pelo Correio, Jucá foi categórico ao afirmar que a prerrogativa de estipular as regras referentes à Lei das Domésticas é do Congresso Nacional. "O governo executa, não legisla. Mas entendemos que ele necessite de tempo para se organizar", minimizou o relator, que propõe ainda a unificação no recolhimento do FGTS, da contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do seguro contra acidente de trabalho.
Com as minutas prontas - um projeto de lei sobre questões trabalhistas e um projeto de lei complementar sobre o FGTS e outras alíquotas - para serem apresentadas possivelmente amanhã aos membros da comissão, Jucá foi, na segunda-feira, chamado às pressas ao Palácio do Planalto, pela ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, para que não divulgasse os documentos. Com a lentidão do Executivo em fechar uma proposta para regulamentar a lei, os textos podem ser aprovados no Congresso Nacional sem a contribuição de técnicos do governo.
Outra reunião entre Jucá e Gleisi estava marcada para o fim da tarde de ontem, mas a ministra pediu o adiamento do encontro e justificou que ainda precisa fechar uma proposta com os ministérios da Previdência, da Fazenda e do Trabalho e Emprego, a Advocacia Geral da União e a Secretaria de Política para as Mulheres.
O projeto do Ministério do Trabalho para normatizar as regras em relação à atuação dos empregados domésticos será finalizado hoje. A previsão é de que seja enviado à Casa Civil até sexta-feira, um dia depois da data na qual Jucá espera apresentar os relatórios à comissão. Para virar lei, qualquer texto precisa passar pela Comissão Mista e pelos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, até chegar à presidente Dilma Rousseff.
Bela discussão
Presente no lançamento de uma cartilha sobre a aplicação dos novos direitos trabalhistas dos domésticos no Ministério do Trabalho, a presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Oliveira, foi taxativa ao dizer que reduzir a multa do FGTS é o mesmo que acabar com a igualdade alcançada com a aprovação da lei. "Vamos fazer barulho no Congresso Nacional, porque a multa não pode diminuir. Somos uma categoria dispersa, mas vamos nos unir para lutar pelas nossas conquistas", completou.
Enquanto o Legislativo, o Executivo e as entidades representativas discutem, sem consenso, pontos das novas regras, pelo menos dois ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) se posicionaram sobre a constitucionalidade de uma eventual redução na multa de 40% do FGTS. Para o presidente da Corte, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, esse assunto será uma "bela discussão jurídica". Ele avaliou que a diversidade nas relações de trabalho tem que ser respeitada, uma vez que a multa não se refere especificamente ao trabalhador doméstico. "Temos de partir da premissa de que a igualdade não consiste em fazer tudo ser igual", explicou Reis de Paula.
O ministro Emmanoel Pereira declarou, por sua vez, apoio à redução da multa para algo cerca de 10%, como é proposto pelo senador Romero Jucá. Segundo ele, o cidadão comum que só tem um funcionário não pode arcar com as responsabilidades de uma empresa que tem milhares de empregados. "Isso não pode ser considerado inconstitucional, porque uma coisa é a Lei das Domésticas e outra, o que está previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)", ressaltou.