As enormes injeções de estímulos nos mercados financeiros dadas pelos maiores bancos centrais do mundo estão criando um efeito dominó em todo o planeta. As medidas levam governos desde o Brasil até a Turquia a tomarem providências para impedir que o dinheiro decorrente do afrouxamento monetário inunde seus mercados e puxe para cima o valor de suas moedas. O Banco do Japão (BoJ) se tornou na quarta o mais recente BC a afrouxar a política monetária. A medida se segue a promessas arrojadas feitas pelos dois maiores bancos centrais do mundo de lançar programas a fundo perdido destinados a sustentar suas economias. O empenho do BoJ visa, em grande medida, estimular a economia moribunda do Japão, em parte reforçando com dinheiro os mercados financeiros, assim como pressionar para baixo o valor do iene para ajudar os exportadores do país. O banco aumentou a magnitude de seu programa de compra de ativos para 80 trilhões de ienes (US$ 1 trilhão) e o prorrogou em seis meses, para até o fim de 2013. O Banco Central Europe (BCE) disse no início do mês estar preparado para comprar títulos dos países da zona do euro que precisam de ajuda para controlar seus custos de captação. O Fed (BC dos EUA) anunciou na semana passada um programa que pretende adquirir US$ 40 bilhões ao mês em títulos referenciados em contratos de crédito imobiliário até a economia se recuperar. Muitos investidores preveem que o Banco da Inglaterra, o BC britânico, anunciará suas próprias medidas adicionais de estímulo ao crescimento. Em meio à enxurrada de notícias vindas dos BCs, os mercados financeiros estão animados, mas calmos. Os investidores observam que as ações e outros investimentos de maior risco apresentaram grandes recuperações ao longo do terceiro trimestre, movidos, em parte, pelas expectativas de uma política monetária mais folgada, o que amorteceu a reação às notícias. O índice Standard & Poor"s 500 subiu 1,65% desde a quarta-feira passada, o dia anterior ao anúncio, pelo Fed, de seu mais recente afrouxamento. Em vista da aparente desaceleração da economia mundial, preocupações com a inflação ou com bolhas dos preços dos ativos decorrentes do empenho dos bancos centrais de injetar dinheiro no sistema financeiro foram, na maioria, postas em banho-maria. Mas, se o nível de atividade da economia se intensificar, essas preocupações poderão ser retomadas em pouco tempo, principalmente no que diz respeito às commodities ou a investimentos de maior retorno. E, em vista de o Fed e outros BCs de peso parecerem comprometidos com longos períodos de dinheiro decorrente do afrouxamento monetário, os investidores preveem que os efeitos de seus atos durarão por meses ou anos. Os esforços dos maiores BCs mundiais para estimular o crescimento de suas próprias economias já estão repercutindo nos mercados financeiros. Os investidores estão migrando a países e ativos que oferecem juros mais altos do que as taxas baixíssimas oferecidas no Japão, nos Estados Unidos e em partes da Europa. Isso está levando outros BCs a empregarem suas próprias medidas, em parte para manter baixas suas taxas de juros ou para tornar suas moedas menos atraentes. Uma moeda mais depreciada torna as exportações de um país financeiramente mais acessíveis no exterior. Ao mesmo tempo, torna as exportações de outros países mais caras. Essa dinâmica eleva o estímulo para que as autoridades de política monetária desvalorizem suas próprias moedas para que seus países continuem competitivos nos mercados mundiais. Como ocorreu em episódios passados de afrouxamento monetário adotados pelos principais bancos centrais de mercados desenvolvidos, muitos investidores estão afluindo para os mercados emergentes que oferecem retornos mais altos e economias de modo geral mais saudáveis. "Todo esse dinheiro gerado pelo Fed vai bater em países estrangeiros", disse Komal Sri-Kumar, estrategista-chefe mundial da gestora de investimentos TCW. "Os mercados emergentes vão ficar tentados a reduzir as taxas de juros... para neutralizar a possibilidade de suas moedas se valorizarem demais." O governo brasileiro tomou medidas na segunda-feira para evitar que as possíveis ondas resultantes do afrouxamento do Fed impulsionem sua moeda, promovendo os chamados swaps cambiais reversos para impedir a valorização do real. Também na segunda, o governo do Peru ajustou a estratégia de intervenções para enfraquecer sua moeda, o sol peruano, e na terça a Turquia anunciou corte maior do que o esperado nos juros. Diferentemente das ocasiões anteriores, que criaram temores de uma "guerra cambial", com ondas de dinheiro dirigindo-se aos países emergentes, há quem acredite que desta vez não haverá reações. Autoridades na Coreia do Sul, Tailândia, Cingapura e Filipinas mostraram-se cautelosas com a alta de suas moedas depois do anúncio do Fed, embora todas tenham declarado estar preparadas para suavizar as oscilações dos mercados se os fluxos de capitais se tornarem excessivos. Investidores, como Alessio de Longis, gestor de carteiras na Oppenheimer Funds, firma com US$ 182 bilhões sob administração, vêm comprando moedas de países como Polônia, Noruega, México e Canadá, cujos bancos centrais parecem menos propensos a tomar medidas para desvalorizar suas moedas em relação ao dólar. Na rodada anterior de afrouxamento monetário quantitativo do Fed, o dólar desvalorizou-se de forma significativa em relação à maioria das moedas. O índice The Wall Street Journal Dollar, que compara o valor do dólar em relação a uma cesta de moedas importantes, caiu 18% nos 13 meses posteriores a junho de 2010, desde que começaram a aumentar as expectativas de que haveria mais estímulos do Fed até o fim do programa de compras de US$ 600 bilhões em bônus no verão americano seguinte. No mesmo período, o índice desvalorizou-se 20% e 18%, respectivamente, em relação ao real e ao won sul-coreano. O declínio do dólar mostrou-se menos pronunciado nas vésperas do anúncio da semana passada. O índice WSJ Dollar está em queda de 6% (na quarta) em relação ao pico de 2012, atingido em julho. O atual cenário é bem diferente do fim de 2010, quando o Fed lançou seu segundo grande programa de compra de bônus, chamado de QE2, para afrouxamento monetário. Na época, o forte crescimento nos países emergentes ajudou a atrair investidores das economias avançadas. As medidas do Fed desencadearam altas reclamações, por parte do Brasil, China e outras potências emergentes, de que um aumento no fluxo de "dinheiro especulativo" aos países desestabilizaria suas economias e alimentaria a indesejada inflação. Em contraste, a criação de empregos nos EUA teve forte desaceleração desde o início do ano. A região do euro já está em recessão, prejudicada pelo agravamento da situação econômica nos países do Sul da Europa, como Espanha e Itália, que se espalhou para seus vizinhos do norte. A maioria das economias emergentes, por sua vez, enfrenta problemas em seus setores de exportação, como consequência das mazelas na Europa. Quase toda grande economia no mundo está vendo seu setor industrial contrair-se, segundo as pesquisas mais recentes de institutos de gerentes de compras. Recentes análises do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre os efeitos da QE2 descartaram muitas das preocupações levantadas originalmente pelo programa de compra de bônus. "Acho que, olhando em retrospectiva, os brasileiros e os chineses, que estiveram entre os maiores críticos da QE2, mudaram sua forma de ver", afirmou Joseph Gagnon, pesquisador sênior do Peterson Institute for International Economics e ex-economista do Fed. Há menos probabilidade de que os países emergentes reclamem desta vez, depois de terem tomado suas próprias medidas para impulsionar as exportações. A China pode limitar a valorização de sua moeda, apesar dos apelos dos EUA para deixar o yuan subir, mas o país "não correrá o risco de um confronto direto com Washington com as eleições se aproximando", disse o economista Simon Evenett, da Universidade de St. Gallen, na Suíça. E o Brasil "perdeu muita credibilidade" ao já ter desvalorizado sua moeda, afirmou. (Tradução de Sabino Ahumada e Rachel Warszawski)
As enormes injeções de estímulos nos mercados financeiros dadas pelos maiores bancos centrais do mundo estão criando um efeito dominó em todo o planeta. As medidas levam governos desde o Brasil até a Turquia a tomarem providências para impedir que o dinheiro decorrente do afrouxamento monetário inunde seus mercados e puxe para cima o valor de suas moedas.
O Banco do Japão (BoJ) se tornou na quarta o mais recente BC a afrouxar a política monetária. A medida se segue a promessas arrojadas feitas pelos dois maiores bancos centrais do mundo de lançar programas a fundo perdido destinados a sustentar suas economias. O empenho do BoJ visa, em grande medida, estimular a economia moribunda do Japão, em parte reforçando com dinheiro os mercados financeiros, assim como pressionar para baixo o valor do iene para ajudar os exportadores do país. O banco aumentou a magnitude de seu programa de compra de ativos para 80 trilhões de ienes (US$ 1 trilhão) e o prorrogou em seis meses, para até o fim de 2013.
O Banco Central Europe (BCE) disse no início do mês estar preparado para comprar títulos dos países da zona do euro que precisam de ajuda para controlar seus custos de captação. O Fed (BC dos EUA) anunciou na semana passada um programa que pretende adquirir US$ 40 bilhões ao mês em títulos referenciados em contratos de crédito imobiliário até a economia se recuperar. Muitos investidores preveem que o Banco da Inglaterra, o BC britânico, anunciará suas próprias medidas adicionais de estímulo ao crescimento.
Em meio à enxurrada de notícias vindas dos BCs, os mercados financeiros estão animados, mas calmos. Os investidores observam que as ações e outros investimentos de maior risco apresentaram grandes recuperações ao longo do terceiro trimestre, movidos, em parte, pelas expectativas de uma política monetária mais folgada, o que amorteceu a reação às notícias. O índice Standard & Poor"s 500 subiu 1,65% desde a quarta-feira passada, o dia anterior ao anúncio, pelo Fed, de seu mais recente afrouxamento. Em vista da aparente desaceleração da economia mundial, preocupações com a inflação ou com bolhas dos preços dos ativos decorrentes do empenho dos bancos centrais de injetar dinheiro no sistema financeiro foram, na maioria, postas em banho-maria. Mas, se o nível de atividade da economia se intensificar, essas preocupações poderão ser retomadas em pouco tempo, principalmente no que diz respeito às commodities ou a investimentos de maior retorno.
E, em vista de o Fed e outros BCs de peso parecerem comprometidos com longos períodos de dinheiro decorrente do afrouxamento monetário, os investidores preveem que os efeitos de seus atos durarão por meses ou anos.
Os esforços dos maiores BCs mundiais para estimular o crescimento de suas próprias economias já estão repercutindo nos mercados financeiros. Os investidores estão migrando a países e ativos que oferecem juros mais altos do que as taxas baixíssimas oferecidas no Japão, nos Estados Unidos e em partes da Europa. Isso está levando outros BCs a empregarem suas próprias medidas, em parte para manter baixas suas taxas de juros ou para tornar suas moedas menos atraentes.
Uma moeda mais depreciada torna as exportações de um país financeiramente mais acessíveis no exterior. Ao mesmo tempo, torna as exportações de outros países mais caras. Essa dinâmica eleva o estímulo para que as autoridades de política monetária desvalorizem suas próprias moedas para que seus países continuem competitivos nos mercados mundiais.
Como ocorreu em episódios passados de afrouxamento monetário adotados pelos principais bancos centrais de mercados desenvolvidos, muitos investidores estão afluindo para os mercados emergentes que oferecem retornos mais altos e economias de modo geral mais saudáveis.
"Todo esse dinheiro gerado pelo Fed vai bater em países estrangeiros", disse Komal Sri-Kumar, estrategista-chefe mundial da gestora de investimentos TCW. "Os mercados emergentes vão ficar tentados a reduzir as taxas de juros... para neutralizar a possibilidade de suas moedas se valorizarem demais."
O governo brasileiro tomou medidas na segunda-feira para evitar que as possíveis ondas resultantes do afrouxamento do Fed impulsionem sua moeda, promovendo os chamados swaps cambiais reversos para impedir a valorização do real. Também na segunda, o governo do Peru ajustou a estratégia de intervenções para enfraquecer sua moeda, o sol peruano, e na terça a Turquia anunciou corte maior do que o esperado nos juros.
Diferentemente das ocasiões anteriores, que criaram temores de uma "guerra cambial", com ondas de dinheiro dirigindo-se aos países emergentes, há quem acredite que desta vez não haverá reações. Autoridades na Coreia do Sul, Tailândia, Cingapura e Filipinas mostraram-se cautelosas com a alta de suas moedas depois do anúncio do Fed, embora todas tenham declarado estar preparadas para suavizar as oscilações dos mercados se os fluxos de capitais se tornarem excessivos.
Investidores, como Alessio de Longis, gestor de carteiras na Oppenheimer Funds, firma com US$ 182 bilhões sob administração, vêm comprando moedas de países como Polônia, Noruega, México e Canadá, cujos bancos centrais parecem menos propensos a tomar medidas para desvalorizar suas moedas em relação ao dólar.
Na rodada anterior de afrouxamento monetário quantitativo do Fed, o dólar desvalorizou-se de forma significativa em relação à maioria das moedas. O índice The Wall Street Journal Dollar, que compara o valor do dólar em relação a uma cesta de moedas importantes, caiu 18% nos 13 meses posteriores a junho de 2010, desde que começaram a aumentar as expectativas de que haveria mais estímulos do Fed até o fim do programa de compras de US$ 600 bilhões em bônus no verão americano seguinte. No mesmo período, o índice desvalorizou-se 20% e 18%, respectivamente, em relação ao real e ao won sul-coreano.
O declínio do dólar mostrou-se menos pronunciado nas vésperas do anúncio da semana passada. O índice WSJ Dollar está em queda de 6% (na quarta) em relação ao pico de 2012, atingido em julho.
O atual cenário é bem diferente do fim de 2010, quando o Fed lançou seu segundo grande programa de compra de bônus, chamado de QE2, para afrouxamento monetário. Na época, o forte crescimento nos países emergentes ajudou a atrair investidores das economias avançadas. As medidas do Fed desencadearam altas reclamações, por parte do Brasil, China e outras potências emergentes, de que um aumento no fluxo de "dinheiro especulativo" aos países desestabilizaria suas economias e alimentaria a indesejada inflação.
Em contraste, a criação de empregos nos EUA teve forte desaceleração desde o início do ano. A região do euro já está em recessão, prejudicada pelo agravamento da situação econômica nos países do Sul da Europa, como Espanha e Itália, que se espalhou para seus vizinhos do norte. A maioria das economias emergentes, por sua vez, enfrenta problemas em seus setores de exportação, como consequência das mazelas na Europa. Quase toda grande economia no mundo está vendo seu setor industrial contrair-se, segundo as pesquisas mais recentes de institutos de gerentes de compras.
Recentes análises do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre os efeitos da QE2 descartaram muitas das preocupações levantadas originalmente pelo programa de compra de bônus.
"Acho que, olhando em retrospectiva, os brasileiros e os chineses, que estiveram entre os maiores críticos da QE2, mudaram sua forma de ver", afirmou Joseph Gagnon, pesquisador sênior do Peterson Institute for International Economics e ex-economista do Fed.
Há menos probabilidade de que os países emergentes reclamem desta vez, depois de terem tomado suas próprias medidas para impulsionar as exportações.
A China pode limitar a valorização de sua moeda, apesar dos apelos dos EUA para deixar o yuan subir, mas o país "não correrá o risco de um confronto direto com Washington com as eleições se aproximando", disse o economista Simon Evenett, da Universidade de St. Gallen, na Suíça. E o Brasil "perdeu muita credibilidade" ao já ter desvalorizado sua moeda, afirmou.
(Tradução de Sabino Ahumada e Rachel Warszawski)
FONTE: Valor Econômico