O retorno dos fundos multimercados sempre acompanhou de perto o desempenho do mercado acionário, seja na alegria ou na tristeza. Mas essa é uma realidade que está mudando.
O retorno dos fundos multimercados sempre acompanhou de perto o desempenho do mercado acionário, seja na alegria ou na tristeza. Mas essa é uma realidade que está mudando.
Estudo elaborado pela HSBC Global Asset Management revela que a chamada "correlação" dos fundos multimercados com a bolsa vem caindo sensivelmente. E, num ano em que o Índice Bovespa cai mais de 15% até ontem, isso é alívio para os investidores.
Não que a rentabilidade dessas carteiras esteja espetacular, mas em geral fica próxima, ou supera o Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI, o juro interbancário).
Depois da crise de 2008, quando o Ibovespa encerrou o ano com queda de 41,22% e machucou a maior parte dos multimercados, os gestores começaram a reduzir a exposição de suas carteiras à bolsa.
De acordo com o levantamento, até junho de 2009, essa categoria de carteiras e o Ibovespa seguiam a mesma direção em 84% das vezes. Agora, em novembro, a correlação estava em 0,52, ou seja, em 52% das vezes, os multimercados acompanham o Ibovespa.
Os multimercados sempre foram vendidos como aplicações cujos riscos estariam pulverizados, já que podem investir em bolsa, juros, câmbio, títulos da dívida externa e até uma parcela no exterior.
Mas o investidor percebeu que sempre houve uma forte correlação entre os multimercados e a bolsa: quando o Índice Bovespa subia, os fundos tinham ganhos; quando o indicador caía, o desempenho dos portfólios era um desastre.
Dados da Associação Brasileira das entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que os multimercados acumulam no ano, até novembro, resgates de R$ 51,862 milhões, dos quais R$ 9,049 bilhões apenas no mês passado.
Vale ressaltar, entretanto, que esses números estão distorcidos por conta de uma migração de recursos entre multimercados para a categoria de renda fixa no valor de R$ 28 bilhões em fevereiro deste ano. Ainda assim, a saída de recursos se mostra alta no ano.
O período de perdas dos multimercados esteve fortemente relacionado à queda da bolsa, mas essa correlação se reduziu significativa após a crise de 2008, diz Mario Felisberto, diretor de investimentos da HSBC Global Asset Management.
Essa redução se mostra positiva principalmente neste ano. Apesar de não estar sendo um ano brilhante para os multimercados, eles não sofreram como a bolsa, afirma. "Isso mostra um amadurecimento do setor, que vem aproveitando mais os instrumentos financeiros tanto do Brasil quanto lá de fora."
Entre 2003 e 2007, os gestores de multimercados compravam o chamado "kit Brasil", ou seja, apostavam na alta da bolsa e quedas do dólar de juros. A partir de 2008, deu-se início a uma certa "seleção natural" no setor, já que muita gente perdeu dinheiro. Mas houve quem conseguisse ganhar, lembra um executivo.
"Com um mercado sem tendência, o trabalho do gestor começa a aparecer mais, assim como a busca por ativos no exterior", diz. "Quem vivia por conta da inércia do mercado não tem conseguido entregar bons resultados agora."
O surgimento de fundos quantitativos - que adotam modelos matemáticos para o gerenciamento de recursos - contribui para essa menor correlação dos multimercados com a bolsa, ressalta Francisco Costa, sócio da Capital Investimentos. Além disso, a popularização dos fundos de arbitragem (que ganham com a diferença entre ativos) explicam também uma parte dessa queda na correlação, lembra ele.
Os gestores que vêm se destacando neste ano estão ganhando dinheiro principalmente com juros, afirma Costa. "Cada vez mais, com o cenário tão indefinido, vão prevalecer os gestores mais técnicos, com análises mais profissionais e que buscam ganhos de curto prazo", diz o executivo. Um pouco do ganho veio também do mercado de câmbio.
Percebe-se que o retorno desses fundos passou a acompanhar mais de perto os movimentos da taxa de juros, diz Rodrigo Menon, sócio da Beta Advisors. "Em agosto e setembro, houve uma mudança na perspectiva de política monetária e o mercado passou a acreditar na queda dos juros", lembra ele.
Além de o prêmio em juros ter ficado mais evidente - o que fez com que os gestores ganhassem apostando na queda da Selic -, houve um amadurecimento do setor de fundos multimercados, afirma Menon. Os gestores passaram a buscar outras alternativas de investimento. "É possível encontrar, por exemplo, fundos com operações de arbitragem entre bolsas mundiais", diz.
Embora os investidores tenham batido em retirada dos multimercados neste ano, a tendência de queda da taxa de juros brasileira deve fazer com que aumente a busca por aplicações mais arriscadas, favorecendo essas carteiras, ressalta Felisberto, da asset do HSBC. "Os multimercados, portanto, poderão registrar um período de captação mais forte no ano que vem."
FONTE: Valor Econômico