Conhecido pelo seu estilo diplomático, tranquilo e afeito à politica da boa vizinhança, o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, subiu o tom e foi mais incisivo para falar da investida de bolsas internacionais que desejam se instalar no Brasil, ameaçando a privilegiada situação da BM&FBovespa de único ambiente organizado de negociação tanto de ações quanto de derivativos
Conhecido pelo seu estilo diplomático, tranquilo e afeito à politica da boa vizinhança, o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, subiu o tom e foi mais incisivo para falar da investida de bolsas internacionais que desejam se instalar no Brasil, ameaçando a privilegiada situação da BM&FBovespa de único ambiente organizado de negociação tanto de ações quanto de derivativos.
"O que tenho visto são oportunistas, gente que vê nos países emergentes a possibilidade de dar uma "beliscada" em mercados que ainda estão em crescimento", disse Edemir, com exclusividade, ao Valor.
Nos últimos anos, o Brasil se tornou parada obrigatória dessas bolsas estrangeiras, dispostas a sondar o potencial do mercado local. Existem "olheiros" de todos os tamanhos, desde gigantes como a Bolsa de Nova York (Nyse, em inglês) que, segundo Edemir, "está sempre visitando o Brasil", até participantes menos tradicionais como a Bats Global Markets, uma plataforma eletrônica americana de negociações que se uniu a gestora brasileira Claritas para montar uma bolsa alternativa.
Para não entrar com a cara e a coragem num mercado que não conhecem, a estratégia de algumas dessas bolsas é se unir a uma instituição local que já domina os meandros do setor.
É o caso, por exemplo, da Intercontinental Exchange (ICE), que em julho comprou 12,4% da Cetip. "A ICE não entrou no capital da Cetip como se fosse um investimento comum, obviamente há um interesse maior, que é o de atuar no Brasil", deduz Edemir.
A própria BM&FBovespa foi sondada pela Direct Edge - um ambiente eletrônico americano de negociações de ações. Vale lembrar que, no mês passado, essa mesma Direct Edge assinou uma espécie de termo de compromisso com a Securities and Exchange Comission (SEC, a comissão de valores mobiliários dos EUA), por estar sendo acusada de ter fracos controles internos, que resultaram em prejuízos de milhões de dólares em negociações perdidas e um sistema fora do ar.
A principal crítica de Edemir a esses possíveis concorrentes que rondam as terras brasileiras é com relação ao perfil dessas instituições.
"Esses sistemas alternativos de negociação não querem ter a carga regulatória e nem os custos de um modelo igual ao nosso [BM&FBovespa] de ser vertical e integrado [bolsa com a negociação de vários tipos de ativos e com uma clearing junto]", diz Edemir.
"A consequência é que esses sistemas não preservam a segurança, e sim a alavancagem, para "beliscar" um pedaço do mercado e depois ir embora", alfineta o presidente da BM&FBovespa.
Apesar de toda cobiça pelo mercado brasileiro, Edemir aposta suas fichas de que não será nada fácil essas bolsas alternativas aportarem por aqui. A primeira grande barreira deve ser a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Edemir cita o próprio caso da BM&FBovespa para ilustrar como a autarquia é rígida na sua concepção de como deve ser o mercado de capitais.
Para atender a uma demanda dos investidores de grande porte, no ano passado, a BM&FBovespa montou uma espécie de sistema alternativo de negociação para grandes lotes de ações.
Seria apenas um ambiente separado de negociação, mas usando o mesmo preço do papel no mercado principal. "Seria apenas um ambiente à parte para que essas grandes compras ou vendas não mexessem muito com o preço do ativo", explica Edemir.
A explicação foi em vão. "A CVM não permitiu, com o argumento de que não é prioridade dividir o mercado principal; tenho a impressão de que, com qualquer outro pedido nessa linha, ela (CVM) não fará diferente", prevê o executivo.
Diferentemente do Brasil, os mercados americanos e europeus são altamente fragmentados em muitos sistemas alternativos de negociação.
Nos EUA, por exemplo, apenas cerca de 24% do volume total de negócios com ações estão na Nyse e 22%, na Nasdaq. Os outros mais de 50% estão espalhados pelos 20 a 30 sistemas alternativos existentes lá. Na visão de Edemir, essa fragmentação tornou os mercados frágeis e suscetíveis a todos os escândalos que ocorreram nesses sistemas.
Ainda sobre competição, o presidente da BM&FBovespa não vê a Cetip como um concorrente, ainda mais depois da aquisição da GRV, da área de gravame (restrição financeira de veículos).
"Não tenho receio da Cetip e sim dos grandes clientes tanto dela quanto nossos, que são os bancos", diz Edemir. "Eles é que são os principais responsáveis pela criação dos sistemas alternativos no exterior, reflexo da insatisfação com os ambientes tradicionais de negociações", completa o executivo.
Independentemente de serem mais ou menos seguros, novos ambientes de negociação aumentariam a concorrência no mercado brasileiro, o que pode ser positivo ao cliente final, ou seja, aos investidores.
"A BM&FBovespa manda sozinha no mercado e sabe bem que essa situação cor-de-rosa pode estar com os dias contados", lembra o diretor de uma corretora que preferiu não ter seu nome citado.
FONTE: Valor Econômico