Você contrai uma gripe e se cura rapidamente. Tempos depois, seu sistema imunológico se lembra de que é preciso manter a proteção contra invasores já conhecidos, graças aos linfócitos T e B (as principais células de defesa do organismo). O princípio da "memória imunológica" é a base de um estudo revolucionário publicado pela revista científica Nature.
Você contrai uma gripe e se cura rapidamente. Tempos depois, seu sistema imunológico se lembra de que é preciso manter a proteção contra invasores já conhecidos, graças aos linfócitos T e B (as principais células de defesa do organismo). O princípio da “memória imunológica” é a base de um estudo revolucionário publicado pela revista científica Nature. A descoberta foi acidental: os médicos Yongwon Choi e Erika Pearce, da Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia, e Russell Jones — da Universidade McGill (no Canadá) — constataram que a metformina, droga usada contra a diabetes tipo 2, pode aperfeiçoar a eficiência das vacinas e melhorar a resposta ao tratamento do câncer.
“Nós descobrimos que os linfócitos T de um camundongo com um defeito em um gene ligado à memória imunológica exibiram um tipo diferente de metabolismo”, explicou Pearce ao Correio, por e-mail. “Então, decidimos usar a metformina para avaliar se as células defeituosas melhorariam sua habilidade de formar a memória imunológica”, acrescentou. Como os pesquisadores suspeitavam, o teste funcionou. Segundo Pearce, a metformina intensifica a atividade do AMPK, regulador molecular do organismo. “Nossos achados são intrigantes por mostrarem que esse medicamento pode ter efeitos diretos sobre os linfócitos, alterando a qualidade da resposta imunológica”, disse.
O sul-coreano Yongwon Choi explicou à reportagem que o mecanismo de memória imunológica ocorre sempre depois de uma infecção ou vacinação. O conceito tem sido objeto de intenso estudo, mas os mecanismos celulares que regulam a geração e a persistência das células T de longa memória permanecem inexplicados. “Nós descobrimos que o metabolismo ou a queima de ácidos graxos pelas células T, após o pico da infecção, é algo crítico para o estabelecimento da memória nelas”, acrescentou.
Os cientistas desenvolveram uma falha na TRAF6 do camundongo — a proteína é importante para a resposta imune. Eles perceberam que as células de defesa CD8 T deficientes na TRAF6 montaram uma reação inicial, um sinal de que estariam aptas a combater a infecção. Mas o “exército imunológico” se esbarrou na ausência das células de memória, problema resolvido pela metformina. Agora, Pearce conta que ela e seus colegas querem compreender os mecanismos celulares e moleculares que regulam a memória imunológica para a posterior aplicação no aperfeiçoamento de vacinas. “A maior parte das vacinas com linfócitos tem boa resposta inicial, mas tem sido difícil desenvolver células T de memória de longo prazo”, reconhece Choi. “Queremos usar a metformina para acelerar a criação de células de memória e aperfeiçoar a imunidade logo depois de uma primeira imunização.”
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A metformina pode ter efeitos diretos sobre os linfócitos, alterando a qualidade da resposta imunológica
Erika Pearce, cientista da Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia